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Resiliência operacional e segurança da informação nos serviços notariais e de registro

ARTIGO: Resiliência operacional e segurança da informação nos serviços notariais e de registro: entre os requisitos mínimos e as melhores práticas

17 de novembro de 2025

Por Carlos Eduardo Ribeiro dos Santos e Igor França Guedes

A atividade notarial e registral brasileira, pela natureza jurídica de seus atos e pelo impacto direto na tutela da propriedade, do crédito, da família e da circulação de riquezas, exige níveis excepcionais de segurança, continuidade e integridade das informações. Nos últimos anos, os serviços extrajudiciais passaram por profunda transformação tecnológica, acompanhando diretrizes institucionais das entidades nacionais do setor (como ONR, ON-RCPN, ON-RTDPJ, e-Notariado e CENPROT) e normativas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), especialmente no tocante à digitalização de acervos, interoperabilidade, preservação de dados e governança informacional.

Nesse cenário, o Provimento CNJ nº 74, de 31 de julho de 2018, que estabeleceu padrões mínimos de tecnologia da informação para assegurar segurança, integridade e disponibilidade dos dados, representou um marco regulatório fundamental. No entanto, é indispensável reconhecer que se trata de um patamar básico, um piso normativo destinado a garantir homogeneidade mínima entre as quase 14 mil serventias do país. A partir dele, abriu-se espaço para que unidades mais estruturadas pudessem avançar significativamente, investindo em inovação, infraestrutura, capacitação de equipes e soluções de segurança da informação em níveis muito superiores ao exigido.

A prática cotidiana demonstra que diversas serventias extrajudiciais – especialmente aquelas de médio e grande porte – já ultrapassaram amplamente o padrão mínimo. Esses cartórios têm implementado políticas constantes de capacitação técnica, treinamentos em boas práticas de TI e segurança cibernética, além de promover reciclagens frequentes das equipes responsáveis pela gestão tecnológica e administrativa. Paralelamente, adotam estruturas modernas e robustas, alinhadas a referenciais internacionais como as normas ISO 27001 e 27701, incorporando ferramentas avançadas de proteção de dados, ambientes redundantes, monitoramento contínuo e gestão profissionalizada da tecnologia.

Nesse contexto, surgiram arquiteturas avançadas de backup e recuperação, como a regra 3-2-1, o uso de backups imutáveis (WORM), a realização de testes periódicos de restauração e a implementação de ambientes alternativos capazes de reativar rapidamente a operação em caso de falhas críticas. Além disso, muitos cartórios vêm investindo em ambientes de alta disponibilidade, redes segmentadas, soluções corporativas de EDR, whitelisting de aplicações e camadas adicionais de autenticação, demonstrando clara preocupação com práticas modernas de segurança cibernética.

Esse investimento constante em tecnologia também é acompanhado de uma governança madura, com runbooks atualizados, planos formais de resposta a incidentes, auditorias internas recorrentes, segregação de ambientes, classificação de informações e indicadores objetivos de desempenho, como RTO e RPO — elementos que sequer são mencionados no Provimento, mas que já fazem parte da realidade das serventias que buscam resiliência e continuidade superiores.

A necessidade de garantir atendimento ininterrupto levou muitas unidades a criarem protocolos de contingência eficientes, capazes de manter o funcionamento mesmo durante falhas tecnológicas. Somam-se a isso treinamentos regulares de equipes, simulações de incidentes, campanhas internas de conscientização e documentação clara de processos, consolidando uma cultura institucional de segurança da informação. Esse movimento não é opcional: decorre da essência constitucional dos serviços notariais e de registro, cuja missão exige publicidade, autenticidade, continuidade e eficácia dos atos.

Outro fator relevante é a crescente interconexão entre as serventias, impulsionada pelas plataformas nacionais que integram e padronizam fluxos de dados (como ONR, ON-RCPN, ON-RTDPJ, e-Notariado e CENPROT). Ainda que aumentem a eficiência, tais sistemas ampliam a superfície de risco, exigindo investimentos constantes em proteção, governança tecnológica, certificação digital, monitoramento e infraestrutura resiliente. Nesse cenário, os cartórios mais avançados atuam como verdadeiros centros tecnológicos, adotando práticas corporativas comparáveis a instituições financeiras e grandes empresas privadas.

A conjunção entre os requisitos mínimos estabelecidos pelo CNJ e a adoção voluntária de mecanismos avançados de segurança, inovação e capacitação criou um cenário singular no Brasil: um sistema extrajudicial que, em muitos casos, opera com níveis de maturidade tecnológica superiores aos de diversos órgãos públicos e setores tradicionalmente regulados. Esses investimentos constantes têm reforçado a percepção de que os cartórios tratam a informação como patrimônio público e compreendem a necessidade de evoluir continuamente em prevenção, resposta, resiliência, infraestrutura e qualificação profissional.

Em síntese, os requisitos do CNJ cumprem papel essencial de uniformização e proteção mínima da integridade digital do sistema notarial e registral. Entretanto, a experiência demonstra que numerosas serventias atuam muito além desse mínimo, investindo de forma contínua em capacitação de equipes, tecnologias emergentes, segurança da informação, governança e infraestrutura. Essa postura não apenas se alinha às melhores práticas internacionais, como reafirma o compromisso permanente com a segurança jurídica e com a prestação de serviços públicos cada vez mais eficientes, resilientes e confiáveis. Assim, mais do que executores de atos formais, notários e registradores transformaram-se em verdadeiras instituições de inovação, proteção de dados e continuidade operacional, fortalecendo o Estado brasileiro e garantindo a confiança do cidadão.

*Carlos Eduardo Ribeiro dos Santos é bacharel em Ciência da Computação e em Ciência de Dados e atua como coordenador de Tecnologia da Informação do Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição de Goiânia (1ºRIGO).

*Igor França Guedes é especialista em Direito Notarial e Registral, presidente do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado de Goias (Sinoreg-GO) e Oficial do Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição de Goiânia.